POR QUE CLAMAR: “JESUS, FILHO DE DAVID”?

Por que clamar “Jesus, Filho de David” era considerada uma atitude ousada, emblemática, e um autêntico exercício de fé em Jesus, naqueles dias?
Como todos já leram, o rei Davi tinha um sonho: construir o Templo, em Jerusalém, dedicando-o ao Senhor. Disse ele: “Em meu coração, propus eu edificar uma casa de repouso para a arca do concerto”.

Esse desejo surgiu quando ele levou a Arca da Aliança para Jerusalém, pondo-a numa tenda muito humilde, se comparada ao palácio real. Há quem diga que a tenda da arca, ficava dentro do seu campo de visão, estabelecendo um contraste entre o luxo do seu palácio de cedro e a humildade da tenda da Arca, o que o deixou em grande conflito.

Isto se expressa no texto bíblico em que ele diz: “Ora, olha, eu moro em casa de cedros e a arca de Deus mora dentro de cortinas” (2Sm 7,2). O rei já tinha tido uma experiência de sucesso, quando construiu um altar ao Senhor, na Eira de Ornã. Na ocasião houve muita festa, sacrifícios e uma manifestação poderosa de Deus. “Então, David edificou ali um altar ao SENHOR, e ofereceu nele holocaustos e sacrifícios pacíficos, e invocou o SENHOR, o qual lhe respondeu com fogo” (1 Cr 21,26). Ele queria muito repetir aquele ‘feito’ anterior.

David: Homem Sanguinário

Mas, para conquistar as terras que Deus prometeu a Abraão e consolidar Israel, como a grande potência que foi, durante o seu reinado e de Salomão, seu filho, Davi derramou muito sangue. Desta forma, não era um bom representante do Templo, que era símbolo de paz, de união e para congregar as tribos (sempre conflitantes) em adoração monoteísta, ao Deus de Israel.

Foi por isto que Deus impediu David, de construir o Templo, falando Ele mesmo ao rei: “Não edificarás casa ao meu nome, porque és homem de guerra e derramaste muito sangue” (1Cr 28,3). David era um rei muito belicoso, ainda que por força das circunstâncias.

Um Dilema Histórico

Embora o nome que tenha se eternizado, como símbolo do Templo tenha sido o de Salomão, contudo, Deus fez uma promessa tremenda a Davi. Promessa incomparavelmente superior, inclusive, à satisfação de construir o Templo. Deus garantiu para David que estabeleceria seu trono para sempre. “A tua casa e o teu reino permanecerão para sempre diante de mim, e o teu trono estará firme para sempre” (2Sm 7,16).

Aqui reside um grande dilema. Dilema de status. O “Trono” ao qual Deus se referiu não é a mesma coisa que descendência. Deus prometeu estabelecer o “trono” de David e não sua ‘descendência’. Vários descendentes de Davi, realmente ocuparam o trono, depois dele, mas foi somente o trono de Davi, que foi estabelecido para sempre.

Por exemplo, Jesus nunca é chamado “Filho de Salomão”, mas é invocado, messianicamente, como “Filho de Davi”. Por que?

Para entendermos a diferença entre descendência e trono, é necessário sabermos que, por incrível que pareça, a realeza de Cristo não vem de Salomão e sim de David. Isto porque os descendentes de Davi perderam a condição de reis, a partir do reinado de Jeconias, seu descendente.

Jeconias, Conias ou Joaquim (filho de Jeoaquim) assumiu o trono de Judá e reinou somente três meses, tendo se rendido ao rei Nabucodonosor e levado cativo para a Babilônia, por ocasião do cerco e destruição de Jerusalém, em 607-606 a.C.

Na Babilônia Jeconias teve sete filhos, os quais conservaram a linhagem real que viria até Cristo, mas, nenhum deles subiu mais ao trono, em Judá, para governar como rei. Deus disse a respeito de Jeconias: “Assim diz Iahweh: Inscrevei esse homem: “Sem filhos, alguém que não teve sucesso nos seus dias” Porque ninguém de sua raça conseguirá sentar-se no trono de Davi e governar de novo em Judá” (Jr 22,30).

Embora a Bíblia apresente Jeconias como “esse homem, sem filhos” (Jr 22,30) devemos entender como’ sem filhos’ em condições de ascender ao trono de David, seu ancestral, visto que, como dissemos, Jeconias teve sete filhos, na Babolônia, mas nenhum deles foi rei em Judá. Para um rei e sua linhagem, não ter trono e nem reinar, era como se não tivesse tido nenhum filho.

Mesmo a linhagem de David sendo mantida, através dos filhos de Jeconias, não houve mais quem se assentasse no seu trono, para reinar em Jerusalém. Zorobabel, o descendente/neto de Jeconias, voltou para Jerusalém (538 a.C) por ordem de Ciro, da Pérsia, mas, como governador (Ag 2,21). Voltou com a finalidade de comandar a restauração da cidade, inclusive do Templo de Salomão, não para reinar.

Vejamos que Deus havia rejeitado a Jeconias (Jr 22,30). Imitando seu pai Jeoaquim, Jeconias se rebelou contra Nabucodonosor, posicionando-se contra o plano de Deus de levar Judá, cativo, como castigo pelos seus pecados graves, cometidos desde quinhentos anos recuados. Em suma: Deus puniu o pecado do povo, utilizando-se de Nabucodonosor, mas, os reis Jeoaquim e Jeconias, não entenderam. Por isto o Senhor rejeitou este, interrompendo o reinado físico, em Judá

Mas, Como Fica a Linhagem Real de Jesus?

Como Deus interrompeu o trono de Davi, em Jeconias, sem afetar a linhagem real de Cristo, como descendente de Davi? Ora, Deus pôs fim à sucessão física, no trono de Judá, mas não ao caráter escatológico, dessa sucessão.

Olhem o que o Senhor diz sobre Zorobabel, “e farei de ti o meu anel de selar” (Ag 2,23). Ora, o anel representa a posse mais preciosa de um rei soberano. A selagem real, com o anel, era uma garantia real de soberania. Em Zorobabel, Deus estava restabelecendo o ‘trono’ de Davi sem, contudo, restabelecer sua dinastia real.

Vejamos: Em Jeremias 22,24, Deus ‘arranca’ com ira, o anel real de Jeconias, sob juramento. “Juro pela minha vida: Ainda que Jeconias, filho de Joaquim, rei de Judá, fosse um anel na minha mão direita, Eu te arrancaria! Diz o Senhor”. Mas, tempos depois, devolve-o a Zorobabel, reafirmando a promessa de estabelecer o trono messiânico de David.

Assim Deus interrompe a ordem dinástica da realeza judaica, mas confirma o trono messiânico de Davi, espiritualmente, ao devolver, para Zorobabel, simbolicamente, o anel da autoridade real. Deus promete a Zorobabel “que ele será restabelecido no trono messiânico de Jesus” (Ag 2,23).

Por fim, o reinado físico e dinástico de David, terminou em Jeconias, mas, quanto à promessa feita ao rei, o trono espiritual/escatológico de Davi foi definitivamente confirmado em Cristo, conforme Deus o prometera em 2Sm 7,16.

INRI: O Reconhecimento Involuntário

Depois do rei Jeconias nunca mais houve rei, descendente de David, que se assentasse no trono para reinar em Judá. Nabucodonosor (Império Babilônico) Dario e Ciro (Império Medo-Persa), Alexandre, o Grande (Império Greco-Macedônio), os Ptolomeus (Egípcios), os Selêucidas (Sírios) e o grande Império Romano, respectivamente, dominaram sobre Judá, de 606 a.C até 400 d.C., como impérios conquistadores.

Internamente, depois de Jeconias, Judá foi governado por Zorobabel (governador nomeado) e por sumos sacerdotes, vassalos dos respectivos impérios, descritos acima. Por exemplo, nos dias de Jesus, Judá era governado pelo Império Romano, o qual designava procuradores para governar a província da Judéia (Pilatos foi um deles).

Assim, Cristo, o Messias, é a confirmação e realização espiritual do estabelecimento e eternização do trono de Davi, como uma promessa perpétua do Deus de Israel, criador dos céus e da terra, o qual é, fantasticamente, o condutor da história. Assim como Cristo é Sumo Sacerdote pela linhagem de Melquisedeque, Ele é, também, Rei de Israel e Rei Eterno de todos os povos, pela linhagem de David.

O título, INRI (Iēsus Nazarēnus, Rēx Iūdaeōrum) colado jocosamente na cruz, pelos soldados romanos, logo acima da cabeça ensanguentada de Jesus, foi uma ordem de Pilatos, a fim de atingir a dignidade dos judeus. Foi fixado na ocasião da sua morte. Sem o saberem estavam ratificando, na realidade, um ato profético (Is 53). Foi um ato involuntário, mas legítimo, de reconhecimento à realeza de Jesus, Filho de David, da parte do inimigo.

O inimigo fez o papel de ‘bobo útil’. Naquela cruz estava, de fato, o rei dos judeus, exposto por seus compatriotas, mas confirmado por Deus, eternamente Rei, em cumprimento ao plano de salvação, traçado desde a fundação do mundo.

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