O catolicismo romano, na sua fase  dominante, conhecido como Idade Média, [1] empreendeu rigorosa censura aos materiais escritos e artísticos, que mostravam Jesus, pelo seu viés histórico: o Jesus homem. Contudo, nos últimos dois séculos (XX e XXI) temos tido, graças a alguns renomados pesquisadores, um farto registro bibliográfico e cenográfico, que nos situam no mundo que viu e viveu Jesus e no mundo que ele viu e descreveu, em suas parábolas.

Humanizar Para Limitar

        A tarefa de capturar fatos pontuais e não canônicos do lado humano de Jesus, sem induzir o leitor a erros e ilações a respeito dele e, ao mesmo tempo, sem fontes plenamente confiáveis é uma jornada penosa e de autenticidade duvidosa. I.é., fora as linhas, entrelinhas e interpretações subliminares dos textos bíblicos canônicos, as outras fontes de pesquisa são a Tradição Católica e os Livros Apócrifos. Sabemos que a principal fonte da Tradição católica a respeito de Jesus, são os Livros Apócrifos como os ‘evangelhos’ atribuídos a Maria Madalena, Tiago, Pedro, Filipe, entre outros, do Antigo Testamento.
Se nos basearmos somente nos quatro evangelhos canônicos – Mateus, Marcos, Lucas e João – pouco saberemos do Cristo que o mundo secular quer conhecer. Por isto eles têm sido impiedosamente atacados e suas mensagens subestimadas. Claro, é conveniente para um autor que produz obras com ilações a respeito de Jesus, querer reduzir a ilações, igualmente, as mensagens desses Evangelhos. Quando tais autores concluem suas obras, tomados de vaidades, sentem-se tentados a atribuir a elas a mesma importância dos Evangelhos canônicos, por pura presunção.

        Antônio Gonçalves Filho, em artigo à Época[2] afirmou que “a multiplicação das edições desses evangelhos e o crescente interesse pelo Jesus histórico permitem antever uma avalanche de novos livros, filmes e peças teatrais baseados nos episódios da vida de Cristo, descritos pelos apócrifos, os proscritos da Bíblia”.

        Como nossa abordagem é de cunho histórico, nada mais natural que reduzamos nossas abordagens, sobre o Mestre, a esse prisma, também. Deste modo, nosso raio de ação fica ainda menor, já que Jesus se recusava a deixar-se envolver pelas matilhas que dominavam o campo político/religioso, no seu tempo.

        Quando as multidões quiseram relacionar a missão de João Batista e Jesus ao sistema de governo da época, achando que o modus operandi deles dois era o mesmo, elas ouviram de Jesus o seguinte: “Que saístes a contemplar? Um cavalheiro vestido de roupas finas? Ora, os que vestem roupas suntuosas, se entregam ao luxo e vivem em delícias estão nos palácios”.[3]

        Para mais além de profusas, “as versões para a vida do Jesus histórico são as mais delirantes”, necessitando haver certo tangenciamento e cuidados em relação às mesmas. Dom Estêvão de Souza, na mesma fonte, diz que “a modernidade não quer ver o Cristo Pascal, mas o (Cristo) cotidiano”. Para ele, “o Cristo revolucionário, político, ganhou em dimensão o que perdeu como profeta escatológico”.

        Frei Betto, no mesmo artigo, diagnostica: “Com a progressiva vinculação entre missão pastoral e conjuntura política, o Jesus histórico passou a ser sublinhado (sic) como paradigma de nossa atuação cristã em meio à realidade terrestre”. Tanto Dom Estêvão, quanto Frei Betto, denunciam a opção que o mundo faz por desconstruir o Cristo, o Messias de Deus e Salvador do homem, em prol de um Jesus demasiadamente humano.

        Humanizar Jesus, em demasia, é uma forma, consciente ou inconsciente, de limitar sua deidade. É uma forma de tentar ‘esvaziar’ sua missão e condição de Sumo Pastor das nossas almas. Assim, envolvidos por tantos delírios e fantasias vamos tendo contato com certos ‘cristos’, que  são nada mais que figuras mentais e arquetípicas de indivíduos e grupos que os criam segundo a imagem e semelhança de homens pecadores.

O Cristo Que Eu Quero
        A obsessão para desvendar os acontecimentos que envolvem Jesus Cristo, no período dos doze aos trinta anos, tem como objetivo reduzi-lo a um mero ser humano. Ora, reduzir Jesus a um reles mortal é o mesmo que esvaziá-lo da sua deidade e missão redentora, pelo que, ele passaria a incluir-se apenas no rol dos heróis da fé e de grandes personalidades mundiais. A graça de Jesus, consiste na sua natureza Divina. Sem isto, ele perde a graça.

        Mas, assim mesmo, o homem segue tentando, teimosamente, reduzir Jesus a um ser meramente humano, como se tivesse necessidade de criar seus ‘cristos’, segundo suas próprias e deturpadas imagens. Criam o Cristo das relações de concubinato -Jesus foi retratado como amante de Maria Madalena[4] – o Cristo dos homossexuais[5] e o Cristo do poder laico, os quais servem de embasamento aos interesses de quem quer se lançar nos braços do poder secular, em nome dele.

          Afinal qual o Cristo que eu quero? Um à minha imagem e semelhança moral, ou um que me sirva de Caminho, Verdade e Vida? Não seria mais útil à minha alma seguir ao verdadeiro Cristo, um modelo moral ao qual devo imitar? Mas, se não pretendo mudar minha conduta moral e, mesmo assim, quero um cristo segundo minha imagem moral, então crio o meu próprio, só que com as minhas condições, caráter e limitações.

        Parece mais fácil e cômodo para o homem, eclipsar o Cristo, Filho de Deus e criar outro segundo seu próprio estereótipo, para segui-lo. Naturalmente o Cristo que crio é limitado, antropomórfico e, consequentemente, com distorções, leves ou profundas, na natureza e no caráter. Porém, um cristo assim, não me alivia do jugo do pecado. Não me serve de nada.

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